Flor-de-Cera: singela como uma poesia

Olá, pessoal! Tudo bom com vocês? Espero que sim e que fique ainda melhor agora.

Estou aqui com mais uma resenha aqui pro Universo Virtual: uma webnovela que acaba de terminar na WebTV e que foi uma das mais comentadas do ano passado pra cá. Trata-se de Flor-de-Cera, obra em 41 capítulos escrita por Carlos Mota baseada em outra história de sua autoria. Li o primeiro e o último capítulo e trago os principais acontecimentos e as impressões que tive sobre a história de Catharine Dumont.

 

 

Vila dos Princípios, cidadezinha fictícia no interior paulista. George Dumont, marido da protagonista, vereador da cidade e vilão oficial, debate com o prefeito Tanaka sobre os problemas de relacionar-se com políticos, a quem se refere como “gente ordinária”. Ele está preocupado com a chance de suceder o descendente de japoneses no cargo máximo da cidade, o que é seu objetivo. Em seguida, volta para casa e descobre que a mulher saiu pra enterrar Alana, a filha do casal. Assim é a relação dele com Catharine: fora de casa, um par perfeito e admirado pela população local; entre quatro paredes, há apenas frieza e apatia. George pouco se interessa em passar o tempo com a família, a ponto de ficar alheio até mesmo sobre a doença e a morte da filha. Ao contrário, prefere se dedicar aos projetos populistas em troca de manter-se sempre no poder. Vive de aparências e da hipocrisia pseudomoralista.

A empregada Ernestina, segundo ele uma “inútil analfabeta”, enfrenta-o, assim como faz a patroa ao retornar do cemitério. A discussão dura boa parte do capítulo. Quando encerra, Catharine está abatida e mostra o lado fragilizado pela vida que sempre teve: o de uma moça rica e sempre “protegida” pelos Dumont. Como a flor-de-cera do título.

Quarenta capítulos depois, Catharine teve uma linda relação com Joaquim, o motorista, e muitos conflitos com um George cada vez mais enlouquecido de ódio e de crueldade. A mocinha está entre a vida e a morte numa cama de hospital, lutando contra a leucemia. Enquanto oram pela recuperação da patroa, Ernestina e Joaquim conversam sobre os aprendizados que têm acumulado com o tempo; entre eles, a alfabetização e o gosto pela poesia por parte da mulher. Ela o incentiva a seguir o mesmo caminho a partir de um trecho do lindo poema Via Láctea, de Olavo Bilac.

Mais tarde, Catharine acorda e descobre que seu verdadeiro pai, Rubens, a quem desprezara anteriormente, foi o doador de medula óssea. Ernestina a encoraja a falar com o homem e a reconciliar-se com ele. É o que acontece na cena mais emocionante do capítulo. Ela não só pede perdão, como também que ele fique com ela em vez de partir pelo mundo como planejado. Rubens, cheio de felicidade, aceita. Cenas depois, mais forte, saudável e empoderada, Catharine passa uma noite em companhia de Pietro, com quem supostamente ficaria junto no final — o autor deixa essa parte em aberto, a critério dos leitores. E assim termina Flor-de-Cera.

 

 

Escrita no formato de narrativa (literário), a obra se destaca no uso equilibrado de recursos líricos em meio às descrições das cenas. Isso dá um ar de novela de época à trama — que se passa, na verdade, nos dias atuais —, assim como a discussão sobre agir em público conforme a moral e os bons costumes, os princípios ditos no nome da cidade, mas não necessariamente assim na vida íntima, característica muito forte da sociedade nas décadas passadas, mas que nos faz pensar se hoje não continua dessa forma. Ou seja, a famosa hipocrisia social, representada especialmente por George e por Dilermando, pai de Catharine, que é a principal vítima do sistema opressor. Personagens criados sob medida por Carlos Mota em características físicas, sociais e emocionais. Não há pontas soltas. Se a protagonista se transformou em uma mulher forte e vencedora, o mesmo aconteceu com sua principal escudeira, Ernestina. De uma criada desacreditada por todos, ela mostrou garra e autoestima quando aprendeu a ler e a apreciar o lindo mundo chamado literatura. Além da reconciliação de Catharine e Rubens, as passagens de Ernestina lendo e escrevendo poemas apaixonadamente e incentivando Joaquim a seguir pelo mesmo caminho são uma lição para todos os escritores. Aliás, para toda a humanidade. Destaco o trecho a seguir:

 

A expressividade poética, como dito antes, é a principal definição da novela e é complementada pelos lindos desenhos de Andréa Mota, esposa de Carlos. Ela está para o desenho como ele para a escrita. Parabéns aos dois artistas pelo presente que trouxeram para o Mundo Virtual. Vejam a arte que ela criou para uma das cenas:

 

Quanto à parte gramatical, Carlos Mota apresenta um texto praticamente prefeito, com um repertório amplo de palavras — algumas até rebuscadas, mas sempre primando pela boa compreensão por parte dos leitores. Recursos líricos também se mostram presentes. Inadequações são raríssimas, como a falta de vírgula em um vocativo ou outro. Há um trabalho de revisão e de aprimoramento bem marcantes.

Flor-de-Cera está disponível no catálogo da WebTV. Corram lá e maratonem os capítulos, porque vale a pena. Em breve, escrevei uma resenha sobre outra história de Carlos Mota, O Desbravador de Identidades, que estreou na mesma webemissora. Será no próximo Boletim Virtual, também da WebTV.

Fico por aqui, mas volto com a análise de uma minissérie de Marcos Vinicius pedida por ele. Aliás, deixo os comentários abertos também para quem quiser uma resenha aqui no Universo Virtual. No mais, desejo um ótimo fim de semana e deixo abraços a todos!

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